segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Os critérios, não tão criteriosos, de Mário Erbolato

Estela Marques
estelasmr@gmail.com

Chefe da sucursal do Estadão em Campinas (SP) nos anos 1970 e um dos fundadores do curso de jornalismo da PUC-Campinas, Mário Erbolato soube aproveitar sua experiência em redação na sala de aula, segundo o professor José Marques de Melo diz no prefácio da obra. O livro “Técnicas de Codificação em Jornalismo” comprova a facilidade do autor em ensinar as minúcias da profissão a quem está chegando e a quem já está no mercado.

Considerado um manual devido à didática e aos exercícios trazidos no final de cada capítulo, este livro de Erbolato desmembra todo o processo produtivo da notícia: captação, redação e edição. Além de listas com chavões a serem evitados nos textos jornalísticos e com a diferença entre a escrita e pronúncia de algumas palavras, a publicação também traz um capítulo para tratar sobre os critérios de noticiabilidade.

Erbolato assume que a concepção de tais pontos como valor-notícia não é unanimidade. Com uma leitura mais atenta e embasada em autores como Mauro Wolf (2003)*, é possível perceber equívocos quanto à classificação. Para análise, é interessante pensar critérios de noticiabilidade sob a seguinte perspectiva: “[..] quais os acontecimentos que são considerados suficientemente interessantes, significativos e relevantes para serem transformados em notícias? " (WOLF, 2003, p. 195).

Entre os 24 critérios de noticiabilidade levantados no livro em discussão, é possível perceber que ora algum é complemento de outro, ora uns não deveriam fazer parte da lista. Por exemplo, os critérios proeminência, confidências e culto de heróis trazidos por Erbolato poderiam constituir um único critério. Ambos se referem a pessoas importantes, que dependem da preferência popular e/ou consideradas heroínas por causa de seus feitos ou ações.

É notável também a relação entre proximidade e marco geográfico, que dialogam com outro critério trazido por Erbolato, o de progresso - no espaço em que o leitor vive. A referência à significância de Galtung e Ruge (1965) é inevitável, já que o jornalista deve se preocupar com a proximidade geográfica e cultural do público. Wolf faz a mesma associação, preserva a denominação ‘proximidade’ e cita os sociólogos, quando na explicação do critério: “[...] susceptível de ser interpretado no contexto cultural do ouvinte ou do leitor” (Galtung e Ruge, 1965, p. 117).

Erbolato separa quatro critérios que poderiam ser classificados como um só, se comparado a Wolf. Humor, raridade, originalidade e expectativa ou suspense poderiam estar contidos em interesse humano. Os primeiros entretem o público com notícias curiosas, assuntos inusitados, acontecimentos que fogem ao cotidiano. Do último é possível interpretar o envolvimento do homem na notícia. Tais explicações são, para Wolf, definições de um único critério: “[...] são interessantes as notícias que procuram dar uma interpretação de um acontecimento baseada no aspecto do interesse humano, do ponto de vista insólito, das pequenas curiosidades que atraem a atenção” (WOLF, 2003, p. 205).

Também atraem a atenção humana, a partir da perspectiva que Wolf traz acima, o critério descobertas e invenções, definido por Erbolato como aquelas descobertas científicas ou históricas que melhorem ou virão a melhorar o padrão de vida humano. O que é visto como dinheiro, em “Técnicas de Codificação em Jornalismo”, se encaixa no que é de interesse humano. Acertar na loteria pode ser considerado raro e curioso, de acordo com Erbolato, que utiliza esse exemplo para ilustrar tal ‘critério’.

Os critérios acima descritos dividem o espaço em interesse humano de Wolf com o que Erbolato chama de sexo e idade e rivalidade. Um dos exemplos de pautas que correspondem a tal critério é casamento ou fatos incomuns a pessoas idosas. Acontecimentos passionais e exploração da sensualidade feminina também atraem a atenção. A mobilização de grupos antagônicos, como ocorre com as torcidas de futebol, é outra referência.

Wolf menciona a relevância na escolha das notícias “quanto à evolução futura de uma determinada situação” (WOLF, 2003, p. 204). É presumível a possibilidade de a situação afetar elevado número de pessoas. Essa classificação envolve três dos critérios considerados por Erbolato: consequências, interesse pessoal e utilidade.

Oportunidade é definido por Erbolato como gancho para desenvolver outras pautas, principalmente as frias; um motivo para divulgação de determinada reportagem. Em caso de nomenclatura, não se configuraria como critério de noticiabilidade. Talvez o fosse se definido como atualidade, que se refere ao produto informativo e diz respeito à concomitância entre a duração dos acontecimentos e a periodicidade do veículo, segundo Wolf.

A premissa jornalística de que “bad news are good news”, presente em Wolf, também está presente nos critérios de Erbolato, dessa vez, com o que ele chama de aventura e conflito e impacto. De acordo com Wolf, é um “pressuposto segundo o qual são noticiáveis, em primeiro lugar, os acontecimentos que constituem e representam uma infração, um desvio, uma ruptura do uso normal das coisas. Constitui notícia aquilo que altera a rotina, as aparências normais”.

É importante ter em mente que os critérios de noticiabilidade não atuam sozinhos, não são autossuficientes. É natural, como mostrado ao longo desse texto, que os critérios se complementem num mesmo grupo ou em diferentes. É o caso da importância, que, segundo definição de Erbolato, é a escolha do editor para selecionar as matérias. Ao parar para analisar, é possível perceber que o motivo da escolha já se configure um critério de noticiabilidade.



Referências

WOLF, Mauro. Teorias da comunicação. Lisboa: Editorial Presença, 2003.[Parte III]

GALTUNG, J. & RUGE, M. H. A estrutura do noticiário estrangeiro. A apresentação da crise do Congo, Cuba e Chipre em quatro jornais estrangeiros. In: TRAQUINA, Nelson (Org.). Jornalismo: questões, teorias e estórias. Lisboa: Veja, 1999.

ERBOLATO, Mário L. Técnicas de codificação em jornalismo – redação, captação e edição no jornal diário. São Paulo: Ática, 1991.




terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Fatores e critérios: uma cadeia da noticiabilidade

Jussara Borges Alves[1]
juborges17@hotmail.com


Resenha PósCOM 
GALTUNG; J.; RUGE, M. A estrutura do noticiário estrangeiro. A apresentação das crises do Congo, Cuba e Chipre em quatro jornais estrangeiros. In: Traquina, Nelson (org), Jornalismo: Questões, Teorias e “Estórias”, Lisboa, Vega, 1993.
 

Listar doze fatores considerados influentes dentro do fluxo de notícias do estrangeiro, ou seja, as condições que os acontecimentos precisam satisfazer para tornarem-se notícias é a tese desenvolvida pelo artigo A estrutura do noticiário estrangeiro. A apresentação das crises do Congo, Cuba e Chipre em quatro jornais estrangeiros, uma escrita de Johan Galtung e Mari Halboe Ruge, estudiosos dedicados à cultura da paz. Publicado em 1965 na Journal of International Peace Research, fundanda por Galtung em 1964, o artigo é dividido em três partes, traduzido mais tarde no livro: Jornalismo: Questões, Teorias e “Estórias. O artigo, porém, contempla apenas duas partes do texto, alegando não haver espaço para a terceira.